Arielle Oliveira concluiu a graduação em Enfermagem há pouco mais de um ano na Universidade Federal do Ceará (UFC). Recém-formada, no entanto, conseguir emprego na área se tornou uma missão praticamente impossível.
Para evitar o desemprego, ela aceitou, no fim de agosto, a proposta para ser professora de Saúde Coletiva em curso técnico de enfermagem. O trabalho é em meio-período, e apesar de ter certa correlação com a graduação da enfermeira, nem de longe reflete a preparação acadêmica ao longo da formação.
Apesar de onde trabalho eles aceitarem somente enfermeiros para dar aula, não é a assistência em si, onde a gente é treinado na faculdade. A gente é treinado para atuar dentro de hospitais, postos de saúde. É diferente de tudo o que já fiz na minha vida, pensei ser algo que não faria ou me daria bem, mas foi a oportunidade que surgiu e eu agarrei, estava há um ano parada e não queria ficar mais tempo parada. As contas vão chegando.
"Não sei como vai ser daqui para frente, penso que os enfermeiros vão ter que migrar para outras áreas ou começar a empreender, porque nos hospitais está difícil", lamenta.
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Situação difícil para a enfermagem em todo o Brasil
A percepção de Arielle Oliveira não é única e reflete um panorama mais extenso e complexo pelo País. É o que indica o levantamento do Instituto Semesp divulgado em setembro deste ano.
A pesquisa aponta que aproximadamente 25% dos egressos do curso de enfermagem não estão exercendo qualquer atividade remunerada no momento, isto é, estão desempregados. A taxa atinge principalmente aqueles com menos de cinco anos de formação.
Ocupação por profissão
O ranking ainda traz outros dados importantes. A maior desocupação está no curso de História, onde 31,6% dos egressos não está em qualquer emprego. Relações Internacionais e Serviço Social aparecem na sequência, com 29,4% e 28,6%, respectivamente, de formados desempregados.
Já na ponta oposta, na relação entre cursos com maior empregabilidade entre os formados, está a Medicina. Segundo o estudo, 92% de todos os egressos da graduação estão empregados na área. Farmácia (80,4%) aparece em segundo lugar, e Odontologia (78,8%) em terceiro.
Cursos com maior taxa de formados empregados
Medicina, com cerca de 9 em cada 10 formados empregados, é a campeã da empregabilidade entre os egressos
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A percepção de Arielle Oliveira não é única e reflete um panorama mais extenso e complexo pelo País. É o que indica o levantamento do Instituto Semesp divulgado em setembro deste ano.
A pesquisa aponta que aproximadamente 25% dos egressos do curso de enfermagem não estão exercendo qualquer atividade remunerada no momento, isto é, estão desempregados. A taxa atinge principalmente aqueles com menos de cinco anos de formação.
Ocupação por profissão
O ranking ainda traz outros dados importantes. A maior desocupação está no curso de História, onde 31,6% dos egressos não está em qualquer emprego. Relações Internacionais e Serviço Social aparecem na sequência, com 29,4% e 28,6%, respectivamente, de formados desempregados.
Já na ponta oposta, na relação entre cursos com maior empregabilidade entre os formados, está a Medicina. Segundo o estudo, 92% de todos os egressos da graduação estão empregados na área. Farmácia (80,4%) aparece em segundo lugar, e Odontologia (78,8%) em terceiro.
O que explica a dificuldade em empregar enfermeiros?
A equipe multidisciplinar que geralmente atua em unidades de saúde tem na figura do enfermeiro o canal de relacionamento entre paciente e famílias. "O médico lida mais com a doença, prescreve as medicações e tratamentos, e nós da enfermagem é quem botamos a mão na massa diretamente com o paciente", explica Arielle Oliveira.
Uma das razões que explicam a alta taxa de desemprego entre os formados nos 1.668 cursos de enfermagem existentes no País, segundo dados de 2021 do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), é justamente a abundância de graduações.
"Existem muitas faculdades que formam enfermeiros hoje em dia. Todo semestre sai muito enfermeiro para o mercado de trabalho, mas não tem vaga suficiente. Quando tem, quer experiência. Como vamos ter experiência se não dão oportunidades?", dispara Arielle Oliveira, que ainda acrescenta que a demanda atual é insuficiente para a quantidade de formados.
"Tem enfermeiros formados há dois, três anos que não conseguiram nada. Os técnicos de enfermagem atendem a uma grande quantidade de pacientes. O hospital emprega mais técnicos do que enfermeiros. Se a gente estiver em uma enfermaria com 30 pacientes, por exemplo, dois enfermeiros são suficientes. Além de ter poucas vagas, tem enfermeiros que já estão na área há muitos anos e não querem sair, enfermeiros que têm dois, três empregos, que saem de um plantão e vão para outro", diz.
A questão do piso da enfermagem
A presidente do Sindicato dos Enfermeiros do Estado do Ceará (Senece), Telma Cordeiro, ainda aponta que a definição do piso nacional da enfermagem, regulamentado em 2022, prejudicou a contratação de profissionais.
Tivemos o nosso piso instituído, mas ele foi totalmente desviado em relação ao que seria dar uma melhor condição de vida para os enfermeiros. A dificuldade de arranjar emprego sendo iniciante antes do piso já era grande, porque as empresas sempre querem alguém com experiência. Antigamente a gente tinha o mercado mais aberto para o estagiário dentro da enfermagem, mas isso se complicou com os anos em função de baixarem os valores.
Como permanece pendente de regulamentação detalhes como o índice que vai reajustar o piso da enfermagem, Telma Cordeiro volta a criticar a definição de um teto para a enfermagem, o que, conforme ela, afeta que profissionais se aloquem no mercado de trabalho.
"As instituições particulares não querem pagar esse piso, e isso complicou muito, porque quando se falou de piso, as instituições particulares aumentaram a carga horária dos enfermeiros, plantões, mas até hoje, está na luta pelo piso. Tudo se complicou. Piorou muito mais em relação a emprego, como a gente já vinha com essa dificuldade. Esse piso atrapalhou demais os enfermeiros", classifica.
Já o professor do departamento de Economia Agrícola da UFC, Vitor Hugo Miro, defende que "a média salarial dos profissionais de enfermagem é inferior ao piso" no Brasil, o que cria maior competitividade pelos postos de trabalho.
"A fixação do piso salarial pode se traduzir em maiores custos para contratar e manter estes profissionais. Seja por parte das empresas, seja por parte dos entes públicos, é esperado que eles se ajustem em razão do aumento nos custos. Assim como em qualquer profissão, a concorrência pelos postos de trabalho que são mantidos se torna ainda mais acirrada", pontua.
Na correlação de trabalho entre médicos, técnicos de enfermagem e enfermeiros, o professor da UFC afirma que as duas primeiras profissões tendem atualmente a criar maiores vagas, situação justificada pela necessidade do mercado de saúde.
"No caso dos médicos, o mercado para estes profissionais no Brasil ainda possui algumas particularidades importantes. No Brasil existe uma demanda muito maior do que a oferta por estes profissionais, principalmente em razão da escassez de profissionais especializados. O mercado de trabalho para médicos possui uma dinâmica de ocupação diferente, com grande composição de profissionais autônomos e organizações de classe com elevado poder de barganha", arremata.
Fonte: Diário do Nordeste